Crítica escrita por Renata Serra para a cobertura do 22º Festival Brasileiro de Cinema Universitário – FBCU

O quinto e último dia da Mostra Competitiva do 22° Festival Brasileiro de Cinema e Universitário selecionou uma agradável janela de curta-metragem. Entre os quatro dos dias, estão produções da USP, UNILA, UFRB e PUC-RS, que demonstram a diversidade do cinema universitário brasileiro. As obras trazem uma variedade de temas, estilos e narrativas, oferecendo ao público uma experiência tanto artística quanto reflexiva.

O primeiro da mostra, As Placas São Invisíveis, é um documentário produzido por alunos da Universidade de São Paulo, com início no ano de 2015. O curta trata sobre as vivências pessoais da diretora e de suas amigas em torno das dificuldades na própria USP, como mulheres negras e periféricas – o espaço de uma universidade pública que ainda é altamente segregada. Embora a USP seja uma universidade pública, o filme expõe como ainda existe uma segregação significativa dentro de seus muros. A estrutura do filme se assemelha a uma roda de conversa, onde em vários momentos são apenas as personagens conversando entre si sobre sua realidade, de forma íntima. É um documentário que, apesar de gravado quase 10 anos atrás, ainda desenvolve uma pauta que ressoa no ano de 2024 – assunto tratado pela diretora no debate após a sessão. Segue uma estrutura clássica de documentário e, por sua duração, não desenvolve alguns pontos, mas é uma obra interessante no circuito documental universitário.

Busco-me é uma produção da Universidade Federal da Integração Latino-Americana, dirigida por alunos do Brasil, El Salvador e Colômbia. O filme acompanha uma personagem com problemas de memória que, todos os dias, costuma escrever na estação rodoviária. Um dia, a entrega de um de seus textos para uma jovem dá abertura para caminhos que levam sua antiga paixão a lhe reencontrar. O enredo ganha profundidade ao explorar o impacto da perda de memória no amor e nos relacionamentos humanos. Os alunos fazem uma pergunta: o amor se esvai junto da memória? É nessa pergunta que o filme constrói seu fio narrativo, mas, apesar de uma interessante narrativa, Busco-me se perde em sua própria melancolia, não conseguindo desenvolver plenamente suas ideias e deixando o espectador com a sensação de que poderia ter ido além.

Câmera Nua, um filme feito para um trabalho final de disciplina da Universidade Federal do Recôncavo Baiano, é um curta documental que explora a cidade pelo olhar inquieto de uma câmera. A “vida normal” é registrada por brechas na porta, janelas e andares de cima, sonorizada com trilhas sonoras de filmes e melodias de rock. A câmera invade espaços da vida do diretor e quebra a normalidade desta pelo olhar do cineasta – é a exploração de um espaço apresentado por alguém acostumado a estar ali. O diretor utiliza a câmera não apenas como uma ferramenta de registro, mas como uma forma de invadir e transformar o espaço, oferecendo ao público um olhar pessoal e, ao mesmo tempo, universal sobre o local. Com influências diretas feitas por meio de referências na própria obra de Antonioni e Lynch – como o diretor explica após a sessão -, Câmera Nua torna-se meu favorito da noite. 

O último filme da noite e, consequentemente, da mostra, foi Concha de Água Doce, realizado por alunos da PUC do Rio Grande do Sul. O curta acompanha a história de um jovem e sua irmã mais nova, e o momento de reencontro dos dois após o mais velho ir embora. É uma história que trabalha com questões de sexualidade e sobre uma irmandade que perdura apesar do que tenta separar. Como estabelecido por um de seus diretores no debate, a água representa a fluidez dessa relação, além da fluidez do personagem de Ariel criança e adulto e a concha algo que não está onde deveria. Concha de Água Doce, em uma fotografia de cores fortes, é um retrato sobre gênero e irmandade, nem sempre tão forte quanto gostaria que fosse.

O debate final é uma interessante adição às obras e acrescenta uma perspectiva sobre as questões de produção por trás do cinema universitário. Os realizadores respondem perguntas sobre seus projetos, a intenção por trás deles e sobre seu futuro no cinema. No fim, o FBCU encerra sua mostra competitiva com projetos interessantes, abrindo portas e perspectivas para o cinema universitário.

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