Crítica escrita por Sophia de Lacerda.  

Sinopse: Durante a pandemia, vivendo sob um governo de extrema-direita, os cineastas Bel Bechara e Sandro Serpa recebem a notícia que vai mudar suas vidas: havia uma criança para ser adotada.

Em Hoje é o primeiro dia do resto da sua vida, Bel e Sandro usam seu veículo de trabalho para registrar um processo que mudará totalmente suas vidas: a adoção de Gael, o primeiro filho do casal. Após aguardar cinco anos na fila de adoção, finalmente chegou o momento de conhecer a criança, que coincidiu com a pandemia do Covid-19. Assim, os dois se abrem com muita vulnerabilidade para a câmera em um tom confessional, com o medo da mudança e a ansiedade cultivada para a chegada de Gael.

Cineastas — e agora pais de primeira viagem —, eles embarcam na aventura de construir uma família; de transformar e serem transformados. Para a chegada de Gael, o casal prepara o espaço físico, desfazendo-se de móveis e pertences, mas também prepara o psicológico, pois, mesmo com as incertezas, eles sabiam que aquele bebê de apenas quatro meses mudaria a visão de mundo deles para sempre. Nesse sentido, a escolha do título a partir da música de Rita Lee resume bem a ideia do filme, que retrata o início daquela família que se encontra com muito afeto em um momento tão conturbado. Não há nada melhor do que a maternidade e a paternidade para exemplificar que abdicar é uma forma de amar.

O ponto que faz o filme ser tão sensível e espontâneo é sua principal motivação de se comunicar com o Gael do futuro e não diretamente com o espectador, que também acaba se comovendo com a história. O documentário surge dessas filmagens caseiras para mostrar ao filho e também do incentivo da assistente social que sugeriu que Bel e Sandro registrassem o processo de alguma forma. Desde o processo judicial para efetivar a adoção até os momentos de Gael se adaptando na casa, o filme é cheio de ternura e mostra que uma criança adotada é tão aguardada e amada por sua família como qualquer outra. Não há distinção para o amor. Hoje é o primeiro dia do resto da sua vida é um documentário de primeiras vezes: enquanto o bebê descobre o mundo, os pais o redescobrem.

É um filme sem fórmulas, sem clichês, que nos convida, de forma muito íntima, a entrar naquela casa e ouvir Bel e Sandro tocando um violão para Gael. A linguagem cinematográfica e a montagem trazem um ritmo e uma fluidez muito agradáveis para o espectador. Nós acompanhamos a rotina desses artistas bem humorados que deixam o filme leve: no primeiro dia depois da chegada do filho, eles afirmam que já fizeram tudo errado nos cuidados dele e se dão nota 2 pelas boas intenções. Em meio a todas as preocupações sobre o bem-estar desse bebê ainda tão pequeno, vemos, também, os pais apresentando ele aos os instrumentos musicais, à música e ao cinema, com direito a Gael, com menos de um ano de idade, sendo introduzido à obra de Yasujiro Ozu na tela do celular de Sandro. Não se deve deixar de lado a presença ilustre do cachorro da família, que veste a camisa de irmão mais velho, sempre de olho no caçula e, eventualmente, rouba a chupeta dele. Seja a emoção, os momentos cômicos, os aprendizados, é tudo muito genuíno do começo ao fim.

Além disso, Hoje é o primeiro dia do resto da sua vida também traz algumas ponderações e reflexões que merecem destaque. O nome da criança, que parece ser algo simples, esconde ali um padrão associado a uma sociedade patriarcal: a ordem dos sobrenomes. Por decisão do casal, os sobrenomes de Gael serão invertidos. Bel e Sandro tiram um momento da construção do filme para explicitar esse fato, que, para muitos, pode parecer pequeno. Entretanto, simboliza uma mudança relevante na organização social da família brasileira, além de servir como instrumento de conscientização.   

Hoje é o primeiro dia do resto da sua vida entrega uma mistura de adrenalina, emoção e ternura em um ritmo muito gostoso que faz o público nem sentir o tempo passar. Com muitos estímulos musicais e culturais, Gael vai pegando o jeitinho de artista dos pais e, mesmo sem conhecê-lo, sentimos orgulho de vê-lo crescer em um ambiente tão amoroso. E quem sabe um dia ele não se “vingue” (nas palavras de Sandro e Bel) e faça sua versão do filme com todo esse material. 

Crítica escrita por Sophia Moreira.  

Sinopse: Durante a pandemia, vivendo sob um governo de extrema-direita, os cineastas Bel Bechara e Sandro Serpa recebem a notícia que vai mudar suas vidas: havia uma criança para ser adotada.

Em Hoje é o primeiro dia do resto da sua vida, Bel e Sandro usam seu veículo de trabalho para registrar um processo que mudará totalmente suas vidas: a adoção de Gael, o primeiro filho do casal. Após aguardar cinco anos na fila de adoção, finalmente chegou o momento de conhecer a criança, que coincidiu com a pandemia do Covid-19. Assim, os dois se abrem com muita vulnerabilidade para a câmera em um tom confessional, com o medo da mudança e a ansiedade cultivada para a chegada de Gael.

Cineastas — e agora pais de primeira viagem —, eles embarcam na aventura de construir uma família; de transformar e serem transformados. Para a chegada de Gael, o casal prepara o espaço físico, desfazendo-se de móveis e pertences, mas também prepara o psicológico, pois, mesmo com as incertezas, eles sabiam que aquele bebê de apenas quatro meses mudaria a visão de mundo deles para sempre. Nesse sentido, a escolha do título a partir da música de Rita Lee resume bem a ideia do filme, que retrata o início daquela família que se encontra com muito afeto em um momento tão conturbado. Não há nada melhor do que a maternidade e a paternidade para exemplificar que abdicar é uma forma de amar.

O ponto que faz o filme ser tão sensível e espontâneo é sua principal motivação de se comunicar com o Gael do futuro e não diretamente com o espectador, que também acaba se comovendo com a história. O documentário surge dessas filmagens caseiras para mostrar ao filho e também do incentivo da assistente social que sugeriu que Bel e Sandro registrassem o processo de alguma forma. Desde o processo judicial para efetivar a adoção até os momentos de Gael se adaptando na casa, o filme é cheio de ternura e mostra que uma criança adotada é tão aguardada e amada por sua família como qualquer outra. Não há distinção para o amor. Hoje é o primeiro dia do resto da sua vida é um documentário de primeiras vezes: enquanto o bebê descobre o mundo, os pais o redescobrem.

É um filme sem fórmulas, sem clichês, que nos convida, de forma muito íntima, a entrar naquela casa e ouvir Bel e Sandro tocando um violão para Gael. A linguagem cinematográfica e a montagem trazem um ritmo e uma fluidez muito agradáveis para o espectador. Nós acompanhamos a rotina desses artistas bem humorados que deixam o filme leve: no primeiro dia depois da chegada do filho, eles afirmam que já fizeram tudo errado nos cuidados dele e se dão nota 2 pelas boas intenções. Em meio a todas as preocupações sobre o bem-estar desse bebê ainda tão pequeno, vemos, também, os pais apresentando ele aos os instrumentos musicais, à música e ao cinema, com direito a Gael, com menos de um ano de idade, sendo introduzido à obra de Yasujiro Ozu na tela do celular de Sandro. Não se deve deixar de lado a presença ilustre do cachorro da família, que veste a camisa de irmão mais velho, sempre de olho no caçula e, eventualmente, rouba a chupeta dele. Seja a emoção, os momentos cômicos, os aprendizados, é tudo muito genuíno do começo ao fim.

Além disso, Hoje é o primeiro dia do resto da sua vida também traz algumas ponderações e reflexões que merecem destaque. O nome da criança, que parece ser algo simples, esconde ali um padrão associado a uma sociedade patriarcal: a ordem dos sobrenomes. Por decisão do casal, os sobrenomes de Gael serão invertidos. Bel e Sandro tiram um momento da construção do filme para explicitar esse fato, que, para muitos, pode parecer pequeno. Entretanto, simboliza uma mudança relevante na organização social da família brasileira, além de servir como instrumento de conscientização.   

Hoje é o primeiro dia do resto da sua vida entrega uma mistura de adrenalina, emoção e ternura em um ritmo muito gostoso que faz o público nem sentir o tempo passar. Com muitos estímulos musicais e culturais, Gael vai pegando o jeitinho de artista dos pais e, mesmo sem conhecê-lo, sentimos orgulho de vê-lo crescer em um ambiente tão amoroso. E quem sabe um dia ele não se “vingue” (nas palavras de Sandro e Bel) e faça sua versão do filme com todo esse material. 

Ir para o conteúdo