Crítica escrita por João Pedro Ferreira.
Sinopse: Um roubo de pedras preciosas reúne um grupo de velhos parceiros do crime. Vigiados por fantasmas do passado, cada um deles deve encontrar sua própria forma de liberdade.
O longa se inicia com um sequestro dentro de uma van, conduzido em meio a uma ação frenética. A narrativa mergulha diretamente no caos, enquanto a câmera — instável, à la Transformers — se move de forma brusca e incessante, gerando uma sensação constante de desorientação. A montagem fragmenta a cena com cortes rápidos e sucessivos, enquanto a trilha sonora, marcada por guitarras de rock estridentes, intensifica a sobrecarga sensorial. Esse excesso de estímulos visuais e sonoros acaba por saturar o espectador, tornando a experiência desconfortável e dificultando qualquer possibilidade de envolvimento com a história.
A principal lacuna narrativa do filme torna-se evidente quando o roubo das pedras, que inicialmente parecia ser o eixo central da trama, é abruptamente deixado de lado. Ao longo da história, o crime, que deveria funcionar como o motor da narrativa, perde relevância sem que seus desdobramentos sejam devidamente explorados. Essa falta de direção narrativa se acentua ainda mais quando um dos bandidos, sem qualquer construção ou desenvolvimento prévio, entra em um surto emocional e passa a agir de maneira impulsiva e irracional. Essa mudança repentina, sem justificativa clara, não apenas compromete a credibilidade do personagem, como também prejudica o ritmo e a coesão da história. A ausência de uma progressão lógica nos acontecimentos, aliada à superficialidade no tratamento dado aos personagens, torna a experiência desorientadora para o espectador, que se vê cada vez mais distante dos eventos e incapaz de se conectar com a trama. Essas escolhas narrativas comprometem seriamente o envolvimento do público, tornando difícil sustentar qualquer tipo de interesse ou empatia pela história.
Já a trama que envolve os jornalistas é um dos poucos momentos em que nos é oferecida uma perspectiva fascinante, especialmente pelo uso de flashbacks intercalados com cenas no presente, que desvendam o crescente interesse de Samantha (Julia Stockler) em investigar o roubo de pedras preciosas e o possível envolvimento de um senador. A maneira como ela se entrega à busca pela verdade cria uma dinâmica envolvente, mantendo o espectador atento e instigado. Em contraste, Luiza (Pally Siqueira) adota uma postura mais cautelosa, questionando os riscos que sua colega está disposta a correr. Essa divergência de atitudes gera uma tensão interessante entre as duas, que, apesar de discordar sobre as ações audaciosas de Samantha, acabam compartilhando uma admiração silenciosa pela coragem e determinação dela. Essa dualidade nas personalidades das protagonistas oferece uma reflexão profunda sobre os limites entre ética e ambição no jornalismo, tornando essa trama a mais envolvente do filme.
Serra das Almas falha em manter uma intensidade constante, sobretudo por não construir uma base sólida para sustentar sua trama. Embora apresente momentos pontuais de interesse, o filme acaba se perdendo em meio a um excesso de estilo e à falta de foco narrativo. A ação desordenada, os personagens pouco desenvolvidos e as reviravoltas pouco convincentes dificultam o envolvimento do espectador com a história principal. Curiosamente, é na abordagem mais contida e cuidadosa da linha jornalística que o filme encontra seu ponto mais forte, revelando um potencial que poderia ter sido melhor explorado com escolhas narrativas mais equilibradas e atenção à construção dramática. Ainda assim, a reflexão em torno da ética e da ambição se destaca como o aspecto mais instigante da obra, oferecendo uma camada de profundidade que, se aliada a uma narrativa mais coesa, poderia resultar em uma experiência significativamente mais impactante e memorável para o público.