Crítica escrita por Mateus José para a cobertura do 26º Festival do Rio.
Sinopse: Em Os Enforcados, Regina (Leandra Leal) e Valério (Irandhir Santos) estão felizes no relacionamento e levam uma vida descontraída na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. Mas desde a morte do pai de Valério, o maior mafioso da cidade, eles procuram uma saída do ninho de vespas criminosas que é o negócio da família desta família. Mas ao mesmo tempo, o casal também têm despesas e dívidas para quitar e o tio de Valério, Linduarte (Stepan Nercessian) insiste que o sobrinho assuma o negócio. Numa noite acidental, os dois encontram uma solução para o problema: matar o tio e vender o negócio. Mas ao fazer isso, mergulham ainda mais na violência da qual queriam escapar.
Oportunidade ou maldição?
Imagine que você está com a corda no pescoço e surge a chance de trocar de lugar com outro antes da execução. No entanto, esquece que, além da corda no pescoço, há outra em seu calcanhar. Essa é a premissa de Os Enforcados (2024).
Sob a direção e roteiro de Fernando Coimbra, premiado por O Lobo Atrás da Porta (2013), o filme é ambientado na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, mas grande parte da trama se desenrola na casa do casal protagonista, que está em reforma. Acompanhamos Regina e Valério, que, ao descobrirem que estão falidos, decidem tomar o controle dos negócios ilícitos da família. Para isso, planejam assassinar Linduarte, tio de Valério e responsável pelas operações. Desde o início, o filme deixa claro o labirinto em que os personagens se encontram — a cada problema resolvido, surgem novos, e a tensão e a violência vão escalonando, conforme o casal se vê sem saída.
O roteiro é conciso e prefere mostrar a contar, como na dinâmica do casal: à medida que o imbróglio se avoluma, a relação dos personagens também se deteriora. Se, no início, o filme abre com uma cena de sexo quase selvagem, no meio do segundo ato o casal mal compartilha o mesmo espaço. Embora o roteiro seja eficiente na criação do tom das cenas e nos diálogos pouco expositivos, em sua busca por gerar conflito a qualquer custo, ele acaba se perdendo. Os personagens parecem perder o foco, e a narrativa, que adquire um ritmo linear, torna-se previsível, revelando cedo demais sua resolução.
Nos aspectos técnicos, o destaque vai para o desenho de som, que intensifica o desconforto do espectador. O barulho do ar-condicionado, instalado na parede onde o corpo do tio de Valério está escondido, é ampliado, reforçando a aflição de Regina. Os sons incessantes da obra também contribuem para enlouquecer os personagens gradativamente. A fotografia complementa esse clima de urgência, com closes intensos nos rostos e planos fechados no cenário, mantendo o suspense do que pode acontecer fora do quadro.
Quanto as atuações, Leandra Leal promete muito com seu olhar que alterna entre o sedutor e o ameaçador, sugerindo que a qualquer momento poderá causar um estrago. No entanto, a direção restringe seu potencial, limitando sua personagem a uma mulher mimada e falastrona, que decide viver no mundo do crime, mas não está preparada para as consequências. Irandhir Santos segue uma linha semelhante, com expressões faciais carregadas e um olhar errático, interpretando um homem sempre tentando se provar, mas que, em certo ponto, revela-se tão incapaz que até a narrativa o deixa de lado, focando novamente em Regina.
O filme tenta um plot twist no final, mas que já estava sendo anunciado desde o segundo ato. Mesmo com as ótimas atuações de Leandra Leal e Irandhir Santos, Os Enforcados se torna mais um filme com grande potencial que se perde em sua execução e seus excessos. Em resumo, tem uma boa premissa, mas não sabe o que fazer com ela. O roteiro cria um cenário perfeito, em que parece não haver escapatória, mas ao mesmo tempo que encurrala os personagens ele também se encurrala e sem saber o que fazer com essa situação lança mão de um Deus ex machina jogando fora toda narrativa desenvolvida até então.