Crítica escrita por João Pedro Ferreira.
Sinopse: O filme retrata cinco cruéis torturadores da ditadura de Pinochet, que cumprem suas penas em uma luxuosa prisão aos pés da cordilheira dos Andes. O local possui piscina, jardins e aviários, e os presos são vigiados por guardas que mais parecem empregados. A tranquilidade é abalada quando uma equipe de televisão entrevista um dos internos, cujas declarações geram um impacto inesperado. Temendo uma transferência para um presídio comum, os militares condenados entram em um estado de delírio e violência em meio à paisagem montanhosa.
A ditadura de Augusto Pinochet no Chile teve início com um golpe militar em 1973, e o governo de Salvador Allende se estendeu até 1990. Esse regime foi caracterizado por graves violações dos direitos humanos, incluindo tortura, desaparecimentos forçados e execuções de opositores políticos, ao mesmo tempo em que implementavam-se reformas neoliberais e mantinham-se privilégios para aliados. O filme em questão é inspirado em um evento real de grande impacto na nação chilena, é baseado em um fato que ocorreu no Chile em 2013, quando veio a público que os cinco torturadores mais relevantes da ditadura de Pinochet cumpriam suas penas em uma prisão que mais parecia um hotel de luxo. O diretor do filme, Felipe Carmona, colaborou com atores que foram vítimas do regime, o que acrescentou uma carga de realismo às cenas, como é o caso do ator Hugo Medina, que foi detido e brutalmente torturado durante o período ditatorial, vivendo, posteriormente, um longo exílio em Londres.
O filme é como uma análise minuciosa de cada indivíduo moralmente questionável, que revela, de forma inequívoca, a falta de arrependimento por suas ações. A ausência de responsabilidade demonstrada por esses personagens torna a punição que recebem desproporcional e inadequada. Esse retrato acentua a falta de ética e integridade por parte dos protagonistas, evidenciando uma complexa teia de comportamentos egoístas e manipulatórios que permeiam suas ações. Além disso, a narrativa desafia o espectador a refletir sobre a natureza da justiça e a eficácia das consequências aplicadas. A ausência de um arrependimento genuíno entre os personagens acentua a crítica ao sistema que, embora ostensivamente punitivo, falha em abordar a verdadeira essência da moralidade e da responsabilidade pessoal. Em vez de proporcionar uma resolução satisfatória ou uma lição de vida, o filme deixa o público com uma sensação inquietante de que o ciclo de comportamento antiético é perpetuado sem verdadeira transformação ou redenção.
A narrativa frequentemente se desvia para uma linha de enredo secundária centrada em um dos guardas, o que acabou reduzindo meu interesse. Embora essas seções adicionais ofereçam maior profundidade aos personagens, tais desvios promovem uma sensação de fragmentação e prejudicam a coesão geral da obra.
A cinematografia do filme é excepcional, utilizando uma abordagem monocromática com cores primárias de forma refinada para enriquecer a narrativa. Cada tonalidade realça aspectos temáticos e emocionais específicos. Por exemplo, a predominância da iluminação azul nas cenas externas à residência simboliza o isolamento dos personagens nas montanhas, acentuando a sensação de frieza e afastamento. O vermelho, visível em uma parede dentro da prisão, está frequentemente associado a situações de risco e violência, refletindo a brutalidade dos protagonistas. Em uma floresta escura, a presença de tonalidades amareladas, usadas como fonte de luz para iluminar os personagens, indica sinais de cautela e atenção, sugerindo a iminência de um perigo.
Prisão nos Andes é uma obra inquietante que incita o espectador a uma profunda reflexão sobre as ações dos personagens de caráter moralmente questionável, apresentando como o passado molda e exerce uma influência significativa e alarmante sobre o presente.