Por Diego P. Damasceno. Jornalista, fez mestrado na universidade de Paris e doutorado na Unicamp na área de cinema. Escreve sobre cultura e imagens em movimento no perfil instagram.com/electricxcinema.
Longa-metragem assistido no Japanese Film Festival Online 2024, disponível de 5 a 19 de junho.
A comédia é a realidade vista a partir de seu componente de imprevisto. Paira sobre toda comédia a possibilidade de o mais corriqueiro dos eventos se transformar no mais confuso e indesejado acontecimento. É isso que teme todo personagem do gênero; é isso que espera todo espectador dele. Como o confuso e o imprevisto vão se instalar na normalidade é o que definirá o tipo de comédia. Wedding High (2022), que tem direção de Akiko Ôku e roteiro de Bakarhythm, não se compromete com nenhuma vertente específica. Antes, é movido pela consciência do quão variada a comédia no cinema é. A forma final do longa-metragem estimula tipos de riso diferentes e confere ao todo leveza e significado.
A primeira referência é, claro, a da comédia do casamento que Hollywood consagrou nos anos 1930 e 40 (Núpcias de Escândalo, de George Cukor e lançado em 1940, é um exemplo dessa tradição). Mas há também a revestir o filme está o olhar típico da comédia de costumes, em que uma sociedade é analisada em suas tradições, valores e expectativas a partir de uma situação dada. Tem pelo menos uma cena que remete ao subgênero cômico do stoner film, e todo um arco de um personagem importante é desenhado como um buddy comedy (filmes em que amigos vivem aventuras que têm como motivador casamento, sexo ou romance). Outro segmento é construído em torno de uma situação típica de comédias escatológicas. Pode parecer muito para se contar a cerimônia de casamento de Maho (Ryôko Shinohara) e Akihito (Tomoya Nakamura), mas justamente porque o filme alterna os pontos de vista de quem narra a história, fica claro para o espectador de que ele quer mesmo assumir uma perspectiva exploratória de suas referências, sem se comprometer com nenhuma delas.
Assim, a estrutura narrativa também fala a respeito do mundo contemporâneo, no qual tanto redes sociais estimulam a divisão da atenção quanto a própria oferta de oportunidades de olhar para uma tela só cresce. Que o filme traga uma visão sobre a contemporaneidade também é evidente, em que se encena um confronto entre a tradição japonesa do casamento, com seus ritos e expectativas particulares, e a atualidade da cultura individualista. O casamento é, em Wedding High (2022), uma metáfora para a maturidade, e essa imagem se choca com a ideia de que o individualismo hedonista é uma opção de vida cada vez mais assombrada pelo capitalismo. No fim, que o casamento seja não só para os noivos, mas também para personagens como um tio ilusionista fracassado, ou um colega da faculdade que é um cineasta frustrado, um evento do qual se pode esperar uma mudança concreta de vida, é uma ideia que ao mesmo tempo empresta força (porque amarra todas as situações cômicas) e dá a obra a leveza de que precisa para que possa ser, de fato, engraçada.