Crítica escrita por Marcelle Souza.

“De quantas maneiras uma pessoa pode ser vista e mesmo assim continuar invisível?” é um questionamento que Às Vezes Quero Sumir, dirigido por Rachel Lambert, aborda em sua narrativa, de forma brilhante, a partir de uma protagonista introspectiva, monótona e que fantasia sobre diferentes formas de morrer. A dificuldade de participar, aliada à faísca de ser notada ainda que da forma mais mínima possível, como, por exemplo, alguém tirar uma dúvida sobre o trabalho com você , transforma-se na ansiedade de que, a partir do momento de que te veem de todos os ângulos, as possíveis decepções, que virão ao se criar intimidade com novas pessoas, possam emergir.

No longa-metragem estrelado por Daisy Ridley, a personagem Fran trabalha em um escritório de uma empresa que nunca é revelada, apenas sabemos que é relacionada à catalogação de produtos —, que, embora entediante, ela parece amar aqui, acredito que o fascínio seja pelo motivo de que o ambiente entediante serve como uma camuflagem para ela: as divisórias, as paredes beges, os sons de teclas de computador, os telefones e os aparelhos eletrônicos são formas de se esconder e de se misturar a todos os outros colegas de trabalho. Às Vezes Quero Sumir é um belo retrato sobre a depressão e constrói isso muito bem ao mostrar as diferentes formas em que a doença se manifesta na protagonista: em nenhum momento assistimos Fran se derramar em lágrimas, como muitas vezes o cinema retrata a doença, mas ao se isolar de uma confraternização no escritório, passar o dia inteiro em sua cama sem nenhum tipo de entretenimento (apenas sozinha e acordada com seus próprios pensamentos) e fantasiar sobre maneiras que sua morte poderia ser executada, sem nenhuma imagem violenta somente a calmaria de se deitar em uma floresta ou a mágica de seus pés se suspenderem no ar , entendemos perfeitamente a dor de Fran e nos conectamos com a angústia que é sofrer em silêncio.

Mais adiante no filme, quando seu novo colega de trabalho, Robert, surge no escritório, Fran começa a se interessar pelo homem e é quando conhecemos a versão mais liberta da personagem. O roteiro de Stefanie Abel Horowitz e Kevin Armento é muito estratégico e se desenvolve maravilhosamente pelo fato de que, enquanto o relacionamento dos dois avança, o espectador começa a conhecer Fran simultaneamente a Robert, e é como se estivéssemos em todos aqueles encontros também: tudo o que sabemos sobre os gostos e vivências da protagonista é o que ela decide compartilhar com seu interesse amoroso. Entretanto, o quase relacionamento se estagna em um ponto que Fran não parece confortável em dividir mais sobre si mesma e, embora ela saiba a necessidade de se entregar para que aquilo perdure, seus ataques de pânico, sobre quais podem ser as consequências de deixar alguém entrar na sua vida, a fazem se fechar novamente em seu casulo. 

Robert percebe que aquilo não é o suficiente comparado ao tanto que ele está disposto a se dedicar àquela conexão, dando espaço para o roteiro retratá-lo não como um herói, mas sim como alguém que não pode e nem cabe à ele salvar Fran da depressão. Robert, então, distancia-se de Fran após pressioná-la a se abrir com ele uma atitude terrível a ser tomada para com alguém que possui transtornos mentais, entregando que Robert desconhece da doença de Fran e não obter a resposta positiva que gostaria. Isso torna Às Vezes Quero Sumir uma bruta e maravilhosa representação da vida real, demonstrando o quão difícil pode ser amar alguém que está tentando achar seu caminho para fora do labirinto.

Em síntese, Às Vezes Quero Sumir é um ótimo filme sobre a depressão, por explorar os espaços de isolamento pessoal no qual a protagonista está inserida, passeando pelo cerne de seu pensamento suicida de forma delicada e nem um pouco apelativa, através de um desenho de som focado em sons ambientes singelos e tranquilos, trazendo leveza e calmaria para um momento tão angustiante como o fim da vida. O filme captura, com maestria, o medo e a insegurança de deixar que te vejam por completo e, principalmente, o ato de querer a companhia, mas não saber o que fazer com ela. 

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