Três anos do lançamento do filme Bacurau, de uma trama que se passa no futuro e hoje é tão presente. Dentre tantas falas imortalizadas, a resposta do garoto ainda ressoa em nossos ouvidos resistentes. Sim, somos gente e a gente quer COMIDA, diversão e ARTE. Os diretores Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles nos sacode as estruturas e nos situa no tempo e espaço de uma narrativa que desconstrói o alerta de que qualquer semelhança seja mera coincidência. São tantos os símbolos deixados pelo caminho fílmico, a começar pelas cenas iniciais em que somos surpreendidos pelos vários caixões caídos na estrada, a morte se anunciava. E não cessa por aí, a escola em ruínas, o ônibus escolar sem a real utilização, os livros em um caminhão caçamba despejados como lixo. Os remédios doados e sem eficácia, a reeleição pleiteada por um político sórdido que levou dor e sofrimento à população. São muitas referências capazes de dialogar com o que estamos vivenciando na atual conjuntura. Diria que Bacurau é aqui, só que agora, há 22 km de distância. É preciso não esquecer do alerta da placa : “Se for, vá na paz.”
          Todas as homenagens a essa narrativa fílmica que em mim, provocou um efeito catártico, ao término da única sessão daquela noite de pré-estreia, deixei a sala do cinema, sem saber muito bem onde estava, se em Natal, se em Bacurau, ou entre os dois mundos. Senti-me vingada! Debaixo daquele pedaço de chão do sertão nordestino, pisando na terra vermelha, batida e quente que levantou a poeira dos sentimentos , recobrando as forças que precisaríamos para os anos que viriam pela frente. Um filme visionário. Que seja até o fim, um fim que está bem próximo, logo ali. Diante de uma cabine solitária, seremos muitos Lungas, muitos cangaceiros andrógenos, como a personagem marcante do ator Silvero Pereira, a usar o dedo indicador não para formar arminha, mas para apertar duas teclas que serão como balas dirigidas ao pior governo da história desse país. Viva a ARTE que SALVA. Que possamos cantarolar Geraldo Vandré que fez parte da trilha sonora e foi BG dos créditos finais: “Vim aqui só pra dizer, ninguém há de me calar, se alguém tem que morrer, que seja pra melhorar. Tanta vida pra viver, tanta vida a se acabar, com tanto pra se fazer, com tanto pra se salvar. Você que não me entendeu, não perde por esperar.”

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