Ontem, dia 28/03 tivemos a 94ª cerimônia do Oscar – talvez a mais (im)previsível cerimônia de todos os tempos.

Diante da necessidade de alavancar a audiência da premiação depois da catastrófica cerimônia de 2021, o Oscar optou por uma festa mais curta – com 1/3 de seus prêmios simplesmente não sendo exibidos. Dentre eles, destaca-se Trilha Sonora – um prêmio que normalmente traz nomes conhecidos do público como John Williams e Hans Zimmer (vencedor por Duna, inclusive) – e Montagem – justamente o momento em que o filme se constrói, parte essencial da produção de qualquer obra.

É impossível não pontuar o erro de tal decisão. Além de estipular uma hierarquia completamente desajustada (figurino acima de design de produção?; melhor música acima de trilha sonora?; montagem abaixo de todas as outras?), tal escolha ataca o aspecto didático da premiação. Afinal, para muitos espectadores, o Oscar pode ser a forma mais direta de começar a entender o papel da montagem ou do design de produção, por exemplo.

Pior, se tal decisão era para diminuir o tempo da cerimônia – não ajudou que ela tenha continuado chatíssima e descoordenada. Dando tempo para as infindáveis piadinhas de comediantes com Hollywood (mais sobre isso, daqui a pouco) e tentativas destrambelhadas de alcançar o público jovem, ela acabou caindo nos mesmo velhos problemas. O principal deles, as famosas (e insuportáveis) interrupções nos discursos dos ganhadores – algo que voltou a gerar momentos incômodos e desnecessários.

Interrupções, vale lembrar, que também seguem uma hierarquia: equipe de fotografia ou vencedores de “Melhor Animação” não tem tempo para falar – Will Smith tem todo tempo do mundo. Isso, é claro, vem de uma tentativa direta de alcançar as novas gerações. Will Smith é uma figura (até então) carismática e reconhecida, Billie Eilish também. Até aí, tudo bem. Porém a decisão de criar um Top 5 de cenas empolgantes eleitas pelo Twitter, fazer uma apresentação musical para We Don’t Talk About Bruno ou chamar o BTS para falar sobre a Pixar, são decisões que não fazem sentido algum se não o mais puro desespero de se manter relevante para um grupo etário que não está nem aí. Os jovens, afinal, estão na Twitch e no Youtube – e não na TV Aberta.

Quanto a premiação, é o que foi falado – a mais previsível das últimas décadas com literalmente todos os favoritos vencendo as principais categorias. E isso não é nem mesmo uma coisa boa, uma vez que muitos dos favoritos estavam longe de serem os melhores em suas categorias, como é o caso de Will Smith em atuação (certamente a pior entre os 5 indicados), Belfast e CODA para roteiro, e – principalmente, CODA para melhor filme.

Quanto a isso, quero apenas pontuar como o Oscar fez de tudo para abraçar a mediocridade do cinema estadunidense. Não estou falando que eles deveriam dar o Oscar para os superiores Drive My Car, A Pior Pessoa do Mundo ou Titane – mas mesmo entre os filmes estadunidenses existiam candidatos indiscutivelmente melhores: Ataque dos Cães, Licorice Pizza, Belfast… Ou mesmo Mass, Shiva Baby e The First Cow, se formos pensar nos esquecidos. Ao optar privilegiar um filme “sessão da tarde” adaptado de um filme francês como “Melhor Filme Estadunidense do Ano”, a academia escolhe a mediocridade como “farol” de sua indústria. Um filme, afinal, motivado pela dificuldade do estadunidense de encarar filmes estrangeiros.

Esclareço: CODA não é um péssimo filme. E não é culpa dele esse hype completamente infundado que dominou a academia nas últimas semanas (basta ver que o filme não foi nem mesmo indicado a Melhor Direção, algo raríssimo de ocorrer com vencedores da categorias principal). CODA é um filme muito competente e que – merecia sim – levar o importante (e representativo) Oscar de melhor ator coadjuvante. Porém, colocar nele o título de “Melhor Filme” é jogar uma responsabilidade que a obra não merecia. Não duvido que em poucos anos eles passe a figurar nas listas de piores filmes a ganhar a estatueta, fazendo companhia para os medíocres Greenbook, Crash, A Volta ao Mundo em 80 Dias, Carruagens de Fogo, O Maior Espetáculo da Terra e Shakespeare Apaixonado.

Além disso, é importante falar sobre a concentração de prêmios técnicos para Duna que – apesar de muitos deles serem merecidos – vai de encontro a proposta na academia nos últimos anos de espalhar (um pouco) tais premiações. Além disso, essa concentração é injusta. É inacreditável pensar que Duna tenha ganhado montagem (um dos piores defeitos do filme – com suas quase 3 horas e construções de flashbacks desnecessários) e fotografia (em cima da obra prima visual – A Tragédia de MacBeth, ou do competente o Ataque dos Cães).

Por fim, falemos do momento imprevisível da noite: o tapa de Will Smith em Chris Rock. Sobre isto, não há muito o que dizer, além de ser o maior escândalo dos quase 100 anos de premiação (La La Land agradece). Em um ano onde o cinema Hollywoodiano premiou sua mediocridade, a cerimônia será lembrada por conta de um ato de violência entre dois homens negros.

Fica a percepção de que o Oscar 2022 não seja apenas mais um passo em direção ao fim da cerimônia ser passada na TV Aberta: seja mais um passo em direção ao seu fim. Por motivos diferentes do Globo de Ouro, Hollywood mostrou mais uma vez toda sua pequenez.

Ps. Se você quiser ouvir mais opiniões ácidas e pontos de vista polêmicos sobre a premiação e os indicados, corre lá no Instagram do OCA-UFF para ver a divertida live de “aquecimento pro Oscar” que gravamos com os professores Marcela Amaral e Filippo Pitanga!

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