Sinopse: Girassol Vermelho é um filme inspirado em Murilo Rubião, mestre do realismo fantástico brasileiro, sobre a jornada de Romeu, um homem que deixa seu passado, numa busca pela liberdade. Por acaso, ele chega a uma estranha cidade onde um sistema opressor e patético, que não permite questionamentos, o arrasta para uma sequência de interrogatórios e torturas. Nesse mundo absurdo, Romeu percebe que perdeu seu maior valor: a liberdade. Cheio de dor e fúria, Romeu, delirante, se entrega a uma nova e ainda mais estranha viagem.

Em Girassol Vermelho (2025), Romeu sai de sua terra natal em busca da liberdade idealizada em sua mente apenas para chegar em um local onde ele se encontra preso. Trata-se de um realismo fantástico em que o personagem desembarca em uma cidade sob um governo ditatorial em que ninguém responde perguntas, e é submetido a interrogatórios e torturas. Romeu é induzido a responder coisas que ele não entende, num ambiente repressivo em que todos o tratam como louco e culpado.

Visualmente, o filme entrega uma qualidade impressionante. É perceptível que trata-se de um orçamento acima da média. A cenografia é muito completa e envolve grandes galpões e estruturas metálicas distópicas que se movem e que mudam a cada corte. Os cenários seguem essencialmente a mesma estética (que considero um pouco batida) de rigidez, tudo é metálico, frio e escuro, aparentando em momentos ser, esteticamente, um copia e cola de Batman (2022), mas que ainda assim considero um destaque muito positivo, que deve abrir portas para que esses recursos sejam mais explorados em produções nacionais.

Contudo, acredito que a trama se escore de forma exagerada em sua fotografia e direção de arte. A maior parte do desenvolvimento do enredo consiste em cenas que seguem a mesma fórmula, mas com apetrechos diferentes. As cenas são arrastadas e causam a impressão de que seu único propósito é demonstrar a quantidade de recursos presentes na produção, por exemplo, cenas em que areia cai sobre o personagem dentro de uma caixa de vidro, que penduram-se do início ao fim da trama e se repetem, o mesmo acontece com a fumaça, o glitter e a espuma de barbear, todas gravadas em contraluz. Fumaça exagerada esta que está presente em todos os momentos, transformando cenários que poderiam carregar alguma carga dramática em uma entrada de casa de show, na falta de um exemplo melhor. A fotografia é de fato muito bem pensada, uma pena que ofusque tudo que está por trás. 

Tenta-se criar momentos de tensão que se sustentam por algum tempo, mas logo se perdem em meio a diálogos sem sentido e redundantes, evidenciados nas cenas de interrogatório, em que o Oficial Superior faz afirmações de “Nós sabemos que foi você” ou “Você não vai escapar” para que Romeu possa apenas responder: “Não sei do que você está falando”, repetidas vezes. Entendo que o recurso da repetição das cenas seja utilizado para acrescentar na construção da confusão, porém, não consigo diferenciar uma cena de interrogatório de outra, são inúmeras, e essencialmente, iguais, com um Oficial sentado atrás de uma mesa fazendo perguntas e afirmações de mesmo sentido, sem adicionar em nada na continuidade. Trata-se de uma história que não avança em nada à medida que o tempo passa, enxergo nesse roteiro uma tentativa de recriar uma versão brasileira de Ilha do Medo (2010), no sentido de apresentar um personagem que confunde delírios com a realidade, vive em uma névoa mental, não tem noção da passagem do tempo e não é responsável por suas próprias escolhas.

O trabalho de som possui seus pontos positivos. A trilha musical conversa com as cenas e adiciona sim no andamento do enredo, entra em ação nos momentos de tensão e de estranhamento, é uma pena, porém, que ela seja completamente ofuscada por erros de montagem, como dessincronização de falas, que aparecem na maioria dos planos, em que os personagens aparecem gesticulando e o som de suas vozes aparecem depois de um intervalo muito grande, normalmente é o tipo de coisa que passa despercebido por mim, mas nesse caso chama atenção até do mais desavisado.

De fato, a essência da obra é traduzida nessa adaptação, a atmosfera que se cria conversa com o objetivo; na maior parte, o espectador está tão confuso quanto Romeu. O ambiente traduz a repressão de um sistema que manipula e inibe a capacidade de pensar daqueles que vivem sob suas garras, e Chico Diaz carrega o enredo sozinho, imprimindo com maestria a desilusão e o conformismo, quando seu personagem se vê sem outra saída senão se render à nova realidade daquele universo.  O final é aberto a interpretações, porém nos deixa envoltos, matutando nessa confusão e nesse emaranhado de informações. Por isso, considero que em partes o filme obteve sucesso.

 

Skip to content