Sinopse: Durante uma festa, Charlotte, uma mãe solteira, conhece Simon, um homem casado. Este novo casal concorda em se ver apenas por diversão, sem vivenciar nada além. Porém, essa relação sem futuro fica perturbada quando novos sentimentos aparecem.
Desejo, Moralidade e Transgressão
Quando se vive em uma sociedade que segue o molde patriarcal cristão, o desejo pode se chocar com a moralidade e ser tolhido. Todavia, alguns transgridem essas imposições e se aventuram a viver seus desejos. É nesse contexto que somos apresentados a Charlotte (Sandrine Kiberlain), uma mãe solteira, confiante e independente que vive romances casuais, e a Simon (Vincent Macaigne), um homem casado, tímido e cauteloso.
Sob a direção de Emmanuel Mouret, que divide o roteiro com Pierre Giraud, Crônica de Uma Relação Passageira (2022) é uma comédia romântica ambientada na cidade de Paris, utilizando cartelas para demarcar a passagem do tempo. Após se conhecerem em uma festa, Charlotte leva Simon para seu apartamento. Desde o início fica claro que se trata de um caso de “opostos que se atraem”, uma vez que a direção faz questão de frisar a insegurança de Simon com a possibilidade de trair sua esposa, enquanto Charlotte demonstra muita familiaridade e serenidade. Além disso, os dois debatem acerca de relacionamentos extraconjugais, culpa e objetificação dos corpos.
Emmanuel Mouret faz um profundo estudo de personagem e consegue transmitir o mais íntimo de seus protagonistas, seja com o zoom da câmera nos rostos para demonstrar que algo os impactou mais do que o normal, seja nos sutis momentos de silêncio, onde olhares e ações ganham protagonismo. Essa escolha narrativa ajuda o filme a não se tornar maçante, mesmo com um roteiro um pouco prolixo, especialmente nos monólogos de Simon. Por mais que eles contribuam para a construção do personagem, tornam-no irritante e inconveniente ao longo do longa.

Como mencionado, o filme é um grande estudo de personagem. Sempre que possível, novas camadas são apresentadas, como na cena em que Charlotte vai ao trabalho de Simon. Ele fica incomodado e com medo de que alguém os veja, enquanto ela demonstra ciúmes pela primeira vez.
A respeito dos aspectos técnicos, a direção de fotografia, assinada por Laurent Desmet, constrói enquadramentos singulares e íntimos dos personagens, além de mostrar uma Paris distinta da que estamos acostumados a ver, retratando paisagens verdes e pontos da cidade menos conhecidos.
Quanto às atuações, Sandrine Kiberlain entrega uma Charlotte confiante, ousada, enigmática e sensível, com seu sorriso de canto de boca, olhares que transbordam emoção e um gestual que diz mais do que as palavras. Já Vincent Macaigne interpreta um Simon desconcertado, sensível e falastrão, com postura quase sempre encolhida, fala doce e movimentos desleixados.
Em suma, Crônica de Uma Relação Passageira é um filme sensível que aborda um tema pertinente e em voga nos relacionamentos contemporâneos. Com direção e cinematografia bem executadas e personagens bem desenvolvidos, a obra se destaca, apesar dos monólogos um pouco cansativos de Simon. Não é um filme inovador, mas acerta ao fazer mais do que estamos acostumados a ver em comédias românticas.